sábado, 6 de novembro de 2010

JUVENTUDE, IMAGINÁRIO SOCIAL E ESPORTES NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO



As práticas esportivas envolvendo a aventura e o risco calculado, seja na natureza
ou em zonas urbanas vêm encaminhando os atores a um ambiente selvagem, carregado de incertezas, que se lhes apresenta ao mesmo tempo hostil e agradável. Esse fascínio pela incerteza, pelo inesperado surge entre indivíduos das sociedades modernas que valorizam a segurança, o compromisso de residência. Próprios da contemporaneidade, os praticantes de esportes aventura adotam princípios de singularidades individuais na busca de qualidade de vida, de sensibilidade, proclamando o seu direito de vivenciar a autonomia. Em torno dessas práticas, são constituídas redes em que os sujeitos partilham, costumes, discursos, emoções e sentidos, vivenciados a partir de sensações e emoções intensas, sob condições de risco calculado, buscam a expansão de seus limites, realizando manobras arrojadas e controladas, como superação de habilidades de desafio extremo (COSTA, 2000).

Cada esporte na cidade, seja jogging, ciclismo, patinação, skaterboard, basquete de rua, futebol, le parkour, apresenta uma relação específica com os locais de prática. No entanto é a aventura de se apropriar da cidade, do bairro, a recriação de novas percepções do quadro urbano que move os praticantes desses esportes à expansão e deslocamentos por outros lugares (COSTA, 2004), desencadeando o que Chantelat, Fodimbi & Camy (1996) chamaram de cidadania esportiva, uma questão aparentemente paradoxal, uma vez que temos o hábito de pensar a cidadania a partir dos critérios jurídicos de maioridade da participação no mundo associativo. Fora das arenas esportivas institucionalizadas, as práticas pelo bairro e pela cidade, requalificam o espaço urbano transformando-o em espaços esportivos dotando-os de novos sentidos e significados, animando-os com suas manobras e jogadas improvisadas. Ciclistas, corredores, caminhantes, os praticantes de skateboard (skaters), os de le parkour. (traceurs), interagem no espaço público constituindo nova ordem sem agressões aos outros passantes.

Próprios de um grupo jovem, vão ressignificando a cidade, promovendo outros
olhares. A apropriação dos espaços (parques, praças, pipes, monumentos) pelo grupo jovem deve expressar idéias de cidadania na conservação dos monumentos públicos. Mas os jovens vão se apoderando dos monumentos e viadutos, no caso do parkour. Caso semelhante se dá com o skateboard street, que consiste no deslizar pelas ruas, calçadas da cidade saltando sobre escadas, bancos, corrimão e com o Le Parkour, uma prática urbana em que jovens (traceurs) executam saltos transpondo obstáculos como muros, escadas, descendo ou subindo prédios, demonstrando eficiência acrobática, força e agilidade. Ambos apresentam um modo individual de reapropriação do espaço público, condição antes vivida apenas como via pública. (COSTA, 2004).

Aos poucos tecem novas rotas, riscando com seus skates ou com seus saltos sobre pontes e prédios, outros caminhos, transgredindo o ordenamento estabelecido nas ruas da cidade, suscitando práticas vibrantes com o deslizar dos seus skates ou com as acrobacias de seus corpos. Daí poder-se dizer que há nesses jovens esportistas, com suas transgressões, uma renovação social esportiva, com outros códigos, outros olhares sobre organização de
grupos, sobre espaço e sobre a cidade que enfeitam com suas performances.

Considerações Finais
A "galera" do skate e a “ turma” do le parkour se agrupam por afinidades, pelo
gosto da aventura e do risco nas manobras realizadas pelas ruas da cidade. A aventura os remete à incerteza e aos desafios. Para esses jovens, arriscar-se nessas manobras traz a sensação de êxtase, experimentada na vertigem (ilînx), um dos elementos do jogo, segundo a classificação de Caillois (1990).
Esses são os "novos" arquitetos urbanos que, com seus jeitos displicentes e
arrojados, se mostram como arquitetos de idéias e, com suas aventuras vão engendrando caminhos, construindo obstáculos, vendo a cidade pronta para abraçá-los, mostrando-lhes as curvas ou as linhas desse espaço repleto de incertezas e mistérios. Desse modo vão ressignificando o espaço público, criando lugares, revitalizando a modernidade reflexiva, desenvolvendo outros olhares, recriando a cidade na vivência dos deslizamentos de suas aventuras.

Para o exercício dessa cidadania esportiva, com suas responsabilidades e limites,
urge que as políticas públicas desenvolvam projetos que possam dar condições de uso por esses atores, mesmo que pareça um pouco estranho ver meninos/homens saltando, fazendo manobras radicais com skates ou deslocando seus corpos em acrobacias por lugares que antes eram utilizados apenas para passagem ou para o trabalho. Esses atores demonstram grande potencial de pertencimento à cidade, evocando um estilo de vida com a mentalidade de eterna juventude.

Por Maria Regina de Menezes Costa, Mestre em Educação Física e Cultura e Vera Lucia de Menezes Costa, Doutora em Educação Física e Cultura
Universidade Gama Filho

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